Procedimentos artísticos que envolvem conceitos de entropia. Alguns exemplos da modernidade. Estudo introdutório - 2009
O termo entropia vem da segunda lei da termodinâmica
que observa nos sistemas fechados o aumento irreversível de desordem e
homogeneidade, ou seja a transformação da energia em formas que diminuem sua força
de trabalho[1] (CAPRA,
1982). A entropia é uma indicação quantitativa de aleatoriedade. Existe um
único e irreversível sentido temporal em direção ao caos e à desorganização
(HAWKING, 1988).
Uma
reflexão sobre o papel da entropia e suas formas de expressão na arte torna-se
relevante quando constatamos que este conceito, amplamente utilizado no
contexto artístico, é responsável pela afirmação de que o universo caminha para
o caos. Tratando-se de um coeficiente de desordem dentro de um sistema, a entropia
pode ser utilizada como parâmetro para se analisar a historia da arte e
identificar as forcas que interferem no seu rumo.
O assunto é amplo e permite numerosas abordagens tais
como a escolha do conceito como tema de investigação, um estudo dos mecanismos
de linguagens desconstrutivas e a subjetividade na interpretação destes
mecanismos. O texto aqui apresentado compreende uma reflexão introdutória sobre
as implicações dos procedimentos artísticos com o conceito de entropia e o
caráter subjetivo das interpretações, conforme o ponto de vista, o momento
histórico e suas circunstancias, utilizando como referência exemplos da
modernidade.
Ao compreender melhor os ciclos de renovação da arte
e, talvez esta aproximação permita perceber com um pouco mais de clareza o que
é contemporâneo hoje.
Ação simultânea de entropia e
forca organizadora
O homem sempre em busca
da imortalidade, para combater a tendência natural entrópica de envelhecimento
e deterioração[2], usa a
força organizadora do intelecto (CAPRA, 1982). Ao mesmo tempo segue seu
instinto, impulso antagônico com o qual procura o equilíbrio e a simetria10,
situação entrópica nos sistemas físicos. A intuição está ligada ao inconsciente
ao passo que o intelecto ao consciente (ZAMBONI, 2006). A ação simultânea
destas duas forças[3],
estabelece um “espaço entre” no qual os movimentos de transformação na história
são modulados.
Para que uma nova ordem aconteça, é necessário que
ocorra antes uma revolução (ARNHEIM, 1974).
De um modo geral e simplificado, ao refletir sobre os
procedimentos artísticos podemos observar no mesmo trabalho, o uso simultâneo
de mecanismos entrópicos e a ação de uma força organizadora neguentrópica. O
artista, ao fazer uso da inteligência e colocar uma intenção em seu trabalho
age contra a entropia. Mas, dotado de uma visão de longo alcance, também
utiliza mecanismos entrópicos para quebrar estruturas e valores estratificados
na busca de novas possibilidades. Permitir a ação da entropia através do uso da
intuição e da incorporação do acaso nos processos de criação coloca o ato
criativo dentro de uma esfera real de existência na qual devemos lidar
constantemente com contingências não controláveis. Ao agir em diálogo com o
meio externo, o artista se faz efetivamente presente no espaço-tempo ao qual
pertence. O erro, manifestação entrópica, abre possibilidades para o surgimento
de novos caminhos (NACHMANOVITCH, 1993).
A sociedade para adaptar-se às constantes mudanças,
precisa ser flexível, sofrer transformações.
Mecanismos entrópicos e neguentrópicos e constituição de ciclos de
renovação
Este assunto é no entanto bem mais complexo.
Procedimentos que envolvem mecanismos entrópicos e neguentrópicos respondem às
circunstâncias do momento e às estratégias escolhidas para lidar com as
diversas situações que se configuram. O impulso criativo pode ser gerado ao
mesmo tempo tanto pela vontade de romper com padrões ultrapassados e
libertar-se de estruturas solidificadas como visando compor novas ordens. A
variável está no grau de envolvimento de cada uma destas forças e caracteriza
as fases da história. A redundância é necessária à assimilação de um novo
conceito que se fortalece até alcançar maturidade. Ao adquirir um contorno ele
simultaneamente adquire rigidez; isto faz com que para prosseguir com as transformações
inerentes à existência de vida[4]
ele seja posteriormente fragmentado. As mudanças no mundo exercem uma pressão
crescente contra os sistemas enrijecidos até seu estilhaçamento. O clima de
instabilidade que acompanham estas situações, traz a busca de um novo
equilíbrio[5],
desencadeia movimentos de reconstrução para formação de novas configurações
(PIGNATARI, 2003). A história se processa com vários vetores de acontecimentos
que se sobrepõem, cada qual com movimentos próprios para formar um oceano de
correntes nas quais procedimentos entrópicos e de construção se mesclam, se
intercalam e resultam m ciclos de renovação. Os valores mudam e determinam a
continuação da historia.
Períodos de repressão ou de acúmulos de tensões tais
como as Grandes Guerras e Dadá[6],
ao contrário, provocaram atitudes que buscavam a ruptura e a desconstrução do
sistema vigente. Já, a necessidade de movimentos de reconstrução em
circunstâncias que sucederam grandes abalos, guerras e revoluções, estimulou a
escolha preponderante por parte dos artistas de procedimentos que privilegiaram
a ordem e a síntese. Tanto o Suprematismo[7]
quanto o Construtivismo[8]
russo podem servir de exemplo para este segundo caso.
A ação da força organizadora associada à ação da
entropia dentro de uma rede de sistemas interligados e sintonizados possibilita
a manutenção de um equilíbrio dinâmico e a constante formação destes ciclos
(CAPRA, 1982). A comunicação entre os sistemas que compõem a rede tem portanto
um papel fundamental na preservação desta forma “sutil” de equilíbrio. Supõe-se
que este processo também se aplique às dinâmicas sociais e justifique a
valorização que se dá hoje aos meios de comunicação.
A transformação do pensamento e a subjetividade nas interpretações
históricas
A noção atual de história da arte começa
quando ela se vincula ao campo de linguagem na passagem do século XIX para o
XX. As vanguardas no início do século XX assumindo uma postura desconstrutiva,
romperam com os ideais de uma arte pela arte e inseriram a produção artística
dentro do contexto de uma realidade de vida, conectaram-na com todos os campos
que atuam na existência do ser humano. A pesquisa em arte não se restringiu
mais apenas aos procedimentos, passou a envolver todo o processo artístico e a
ser compreendida e analisada dentro de uma esfera interdisciplinar, envolvendo
além do seu campo, todas as ciências (MELLO, 2008).
A reprodutibilidade técnica da obra de arte e a perda de sua
áurea no século XIX promoveram o advento de uma cultura de massa. A elite não detinha mais exclusividade no
acesso à esfera cultural. As massas exerceram um papel determinante nas
transformações dos hábitos e costumes (BENJAMIN, 1994).
No entanto, um aspecto que não deve ser ignorado
quando se utiliza o conceito de entropia para leitura e compreensão de qualquer
processo, é a existência do componente subjetivo intrínseco ao julgamento. O
que vem a ser entrópico ou não, o grau atribuído à desordem é relativo e
depende da configuração de quem se coloca a questão, do seu ângulo de visão, e
da sua inserção no espaço-tempo. Disto depende a leitura que faz sobre os
fatos. O novo, não familiar é visto como caótico e portanto se lhe atribui um
alto índice de desordem. A não compreensão de uma nova ordem pode confundir e
gerar como interpretação a crença na ausência de coerência e dos significados
nela implícitos. Somente o distanciamento temporal dos fatos permitirá enxergar
com mais clareza os pontos em comum que revelarão um novo sentido a um conjunto
de atos aparentemente desconectados e caóticos.
Susan Buck-Moss em seu texto Walter Benjamin: entre moda acadêmica e Avant-garde, aponta a
transitoriedade do sentido histórico:
“O sentido histórico é transitório, dependendo não tanto do passado,
como do presente, do estado real das coisas. Assim, a história não pode ser
abordada como um exercício acadêmico, como se dissesse respeito a uma raça de
humanóides que existiram uma vez em Marte. Estamos na história e seu tempo não
acabou. Fazemos a história em ambas as direções temporais, passado e presente.
O que fazemos ou não fazemos cria o presente; o que sabemos ou não sabemos,
constrói o passado. Essas duas tarefas estão inextricavelmente vinculadas no
sentido de que o modo como construímos o passado determina a nossa compreensão
do curso presente.” (BUCK-MORSS, 1998, p.43).
Foster em seu texto Archives of
modern art ressalta a distinção na forma como o modernismo foi visto e
compreendido no pós-modernismo e como ele é visto e compreendido hoje. Se os
documentos e vestígios, se as informações contidas nos arquivos da historia
permanecem, as interpretações variam segundo o olhar da época e suas
configurações. O confronto da critica com a produção permitiu-lhe novas
interpretações sobre este período. O autor comenta a visão de Foucault sobre o
papel do arquivo como sistema que governa a aparência dos enunciados e reúne
memórias necessárias ao estudo da pratica artística, da função museológica e da
historia da arte. O autor considera que a história da arte nasceu de uma
dinâmica entre crises causadas pela fragmentação e reificações de tradições em
processos de remontagem e reanimação (FOSTER, 2002).
Foster, ao confrontar visões dialéticas no período
entre 1850 e 1950 e relacioná-las às esferas da pratica, da critica e da
historia no campo da arte, evidencia as transformações do pensamento e destaca
a possibilidade de novas interpretações sobre os arquivos da arte moderna.
A relação entre o artista e a critica se inicia com
Baudelaire. Este considera a memória o principal critério em arte necessário
como base para os grandes trabalhos artísticos subseqüentes cuja função é a
construção de uma tradição artística consistente. Proust[9]
compreende o museu como um local de reanimação e idealização espiritual das
obras de arte. Adorno ao contrario considera os museus sepulturas que
testemunham a neutralização da cultura e destacam o que ficou para trás. Ele
enxerga o capitalismo como barbárie. Panofsky quer resgatar os fragmentos da
historia da arte de modo a trazer o passado para o presente e reanimá-lo.
Adorno critica a visão capitalista. Para Benjamin, a ruptura nas tradições
provocada pela reprodução mecânica e pela produção em massa, contém ao mesmo
tempo aspectos inicialmente destrutivos e potencialmente construtivos. Também
condena a substituição de valores humanos e ecológicos por valores materiais
ocasionada pelo capitalismo moderno, mas reconhece os benefícios da perda da
aura e da idealização, a percepção de uma nova temporalidade traduzida em novas
linguagens tais como o cinema, somente possíveis graças aos avanços
tecnológicos. Malraux, vai mais alem: ele vê em todo o processo de mudança
social e econômica resultante da industrialização, uma possibilidade de
reorganização. Houve uma mudança radical entre o antigo museu de Baudelaire o
museu de hoje. Não se trata mais de tentar reviver a arte do passado através da
ativação da memória. Esta função esta sendo absorvida pelos equipamentos
eletrônicos que podem ser acessados em qualquer parte do mundo. Na rede o museu
é imaginário (FOSTER, 2002).
O conceito de progresso é histórico e surge com a
modernidade. A exploração social o derruba e o transforma em mito do
capitalismo e do liberalismo. A contemporaneidade não acredita mais no
progresso (BRUCK-MORSS, 1998).
Ao se avaliar o grau de entropia nos processos artísticos
também não se deve desprezar outro fator passível de causar distorções: dados
anteriormente desconhecidos, por serem considerados irrelevantes ou por serem
propositalmente ignorados pelo sistema vigente, muitas vezes não foram
registrados nos arquivos. A memória que se constrói com os arquivos de uma
época está sempre sujeita à manipulação. Conforme as transformações na
percepção e na compreensão do mundo dados camuflados ou obscurecidos pelo
esquecimento poderão vir a integrar posteriormente estes arquivos e alterar a
significação dos fatos na historia. Susan Buck-Morss, utiliza o exemplo das
constelações como metáforas de Benjamin para lembrar a implicação do poder na
manipulação de uma memória coletiva:
“Numa sociedade ideal, conta-nos Benjamin, todas as estrelas seriam
incluídas, e toda constelação seria legível. Mas na nossa isso é impossível. O
poder distorce a visão dos céus, impondo seus pesados telescópios sobre certas
áreas, de modo que sua importância se amplia, obstruindo outras de forma tão
avassaladora, que ficam completamente invisíveis.” (BUCK-MORSS, 1998, p. 44).
Ela cita como exemplo a tentativa inicial dos
bolchevistas engajarem a avant-garde
russa, procedimento este que causou desconforto e posterior conflito em muitos
artistas que não compactuavam com a liderança leninista e não queriam abrir mão
de sua liberdade criativa. A propaganda exercida pelas organizações estatais
colocava toda a arte que não seguisse a direção do partido como algo atrasado,
fora do tempo. Em meados dos anos 20 a
avant-garde russa era considerada antiquada (BUCK-MORSS, 1998).
Estas mudanças de perspectivas e valores reforçam a
visão de que algo que em uma determinada época é visto como procedimento de
desorganização, ruptura e fragmentação, em outro momento pode configurar uma
nova ordem.
Os avanços tecnológicos em aceleração crescente no final do
século XX provocaram mudanças radicais nas relações que o homem estabelece com
seu meio, rompendo as distâncias espaciais e temporais e favorecendo os
deslocamentos e a transmissão da informação. A teoria de relatividade proposta
por Einstein colocou em xeque os pressupostos newtonianos e evidenciou a
estreita relação e interdependência entre espaço e tempo. O indivíduo precisou
transformar-se, reorganizar sua sensibilidade e percepção de modo a adaptar-se
a esta nova configuração do mundo (MELLO, 2008).
A internet representa um poderoso avanço no sistema de comunicação. Ela
transformou a cultura e sociedade mundial ao transpor barreiras
espaço-temporais, ao acelerar e multiplicar deste modo as trocas de informação.
A
necessidade de preservação dos sistemas abertos implícita na premissa de que
todo sistema fechado tenderia ao caos explicaria a tendência para hibridização
nas formas de expressão do homem contemporâneo. Do ponto de vista científico, o
aumento de entropia se caracteriza por um aumento de homogeneidade. As mesclas
entre elementos são resultados de hibridizações. Mas, se sob determinado
aspecto ocorre uma mistura, gradativamente outra nova estrutura de ordem regida
por parâmetros antes inexistentes, e por isso talvez não tão perceptíveis, se
torna visível e constitui uma nova forma de pensamento cognitivo, cuja
estrutura é a princípio possivelmente mais orgânica porém não aleatória. Pode
se considerar então um sistema de “gangorra” no qual a hibridização de um
aspecto conteria em si ao mesmo tempo, a organização de outro parâmetro. A
qualificação do que seja entrópico ou não neste caso não seria antes de mais
nada uma questão subjetiva de interpretação?
As estratégias utilizadas por Dadá exprimiam a
revolta dos artistas com o absurdo da guerra e visavam romper radicalmente com
os valores do sistema vigente[10].
O Suprematismo refletiu o sentimento de esvaziamento que tomou conta do mundo
no pós-guerra, mas opostamente ao Dadá, a procura pela ordem e limpeza
indicaria talvez uma esperança na reconstituição de um equilíbrio. Malevich[11]
rompeu radicalmente com a tradição formal ocidental ao introduzir o
Suprematismo, hoje ainda vivo no campo da arte. Por este motivo seus
procedimentos podem ser vistos como entrópicos. No entanto ele estava
inaugurando uma nova concepção no campo da arte. Com o Quadrado Negro inaugurou sua pintura não objetiva, preparando o
terreno para a crescente desmaterialização do objeto, característica muito
presente na arte contemporânea. As rachaduras provenientes do ressecamento da
tinta testemunham as mudanças permanentes ocasionadas pela passagem do tempo,
assunto este, determinante em sua obra. Seu interesse estava em transmitir
dinamismo e energia, a transitoriedade, os deslocamentos e os ritmos através da
sensação:
“Para Malevich o suprematismo é a sensação cósmica, o ritmo do
estímulo. Toda a realidade física, o mundo objetivo, torna-se movimento, cada
partícula transforma-se em força motriz para a sensação”. (SIMMEN e KOHLHOFF, 2001,
p. 45).
Se sua temática temporal envolveu conceitos
entrópicos, sua obra se caracterizou por um crescente rigor e síntese. Ele
introduziu uma linguagem artística voltada para a razão e para a abstração e
semeou as condições para o aparecimento da arte minimal (SIMMEN e KOHLHOFF,
2001).
As obras de Carl André, Dan Flavin, Donald Judd são
exemplos de uma produção voltada para a ordem, mas para uma ordem de natureza
estranha, oca, sem emoção ou significado. No caso, houve um esvaziamento
completo de entropia, um estado inerte, uma paralisia condizente apenas com a
ausência de vida, um equilíbrio estático de morte. O mundo ainda estava de
luto. A land art é um derivado do
projeto minimalista. Ambos questionavam o papel das galerias. A land art confrontava a própria Terra
utilizando uma linguagem também geométrica com grandes esculturas e desenhos no
solo (DEMPSEY, 2003). Robert Smithson, um dos artistas mais proeminentes desta
corrente artística, procurava um espaço de pouca organização e nenhuma direção
para seu trabalho, espaço que definiu de “entre o lugar e o não lugar” (WOOD et
al, 1998). Ele sempre manifestou um interesse especial pelo conceito de
entropia, pelos processos de autodestruição e de regeneração da natureza
(DEMPSEY, 2003)[12].
Portanto, uma relação que se pode estabelecer entre o
artista e a entropia é o uso que ele faz dela de acordo com sua estratégia para
lidar com a situação que se apresenta.
A produção contemporânea,
sintonizada com a nova realidade espaço-temporal múltipla se caracteriza pela
grande heterogeneidade nas ações artísticas e na constituição de praticas que
eliminam a materialidade do objeto em favor da virtualidade e abstração. A obra
de arte não corresponde mais a um produto, mas é compreendida como um processo
ou acontecimento, como idéia e informação. O uso de tecnologia na criação
artística possibilita a construção de novas realidades sensórias
espaço-temporais e reforça a idéia de arte como processo. Estes procedimentos fazem com que o
interlocutor se envolva mais ativamente e compartilhe da constituição da obra.
Com a era digital as fronteiras entre os diversos meios estão cada vez mais
sutis e a hibridização dos mesmos amplia ainda mais os recursos de linguagem na
constituição de significados. (MELLO, 2008). As estratégias artísticas hoje
objetivam ressaltar o confronto que se estabelece entre arte e vida. A técnica
não é suficiente para qualificar uma obra. Utilizando uma linguagem coerente e
criando dispositivos através do pensamento o artista constrói um significado.
A utilização de recursos
tecnológicos trouxe para um plano comum o virtual e o palpável, trouxe a
problematização de questões contemporâneas tais como o efêmero, o transitório,
a multiplicidade, o dinâmico e a desmaterialização do objeto. Este último se
perde e junto com ele o “original”. A abstração aumenta. Os museus agora
procuram não só cumprir com a função visual de apresentação de uma obra mas
foram transformados em locais de espetáculo[13].
Talvez o desaparecimento do objeto e a crescente virtualidade tenham uma
parcela de responsabilidade no incremento da necessidade do individuo em
sentir-se efetivamente vivo e presente. Isto poderia ser um dos aspectos que
justificariam o desenvolvimento de uma sociedade que busca a experimentação e o
prazer, uma sociedade do espetáculo
conforme Guy Debord a define em sua publicação (DEBORD, 1992).
Baudelaire no texto “O pintor da vida moderna[14]” já
observava a importância do tempo presente[15]:
“O prazer que alcançamos com a representação do presente decorre não
somente da beleza que pode estar revestindo-o, mas também de sua qualidade
essencial de presente.[16]”
(BAUDELAIRE,
1859).
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[1] Como luz e calor
[2] Processos relacionados a
noções de temporalidade
[3] Talvez mais complementares
do que antagônicas
[4] E portanto temporalidade
[5] Talvez ilusório e
temporário já que o tempo não para
[6] Dadá foi o nome dado a um
movimento inicialmente literário fundado em 1916 por artistas e intelectuais de
diferentes nacionalidades que se exilaram em Zurique, na Suíça por serem
contrários ao envolvimento de seus países na Primeira Guerra Mundial.
Pretendiam expressar suas desilusões com a ciência, a filosofia e a religião
que não tinham conseguido evitar a destruição que ameaçava a Europa. Tristan
Tzara, poeta húngaro que fazia parte do grupo, escolheu este nome abrindo e
procurando aleatoriamente uma palavra nonsense no dicionário. A palavra
dada era apenas um símbolo de revolta e indignação. Com isto queriam dizer que
a guerra tinha instaurado o irracionalismo no continente e que portanto a arte
tinha perdido o sentido. Protestavam contra a loucura, o nonsense da guerra.
Dez milhões de pessoas foram massacradas ou ficaram inválidas. O movimento
durou 7 anos.
[7] “Suprematismo (do lat. supremus, supremo) Nome dado por
Malevich ao estilo não objetivo desenvolvido a partir de 1915, cuja forma
básica é o quadrado. O novo símbolo reproduz sensações espontâneas. As
sensações são suscitadas unicamente pelo efeito das formas geométricas puras,
ou seja, das formas abstratas. O suprematista “sente” a arte, não a observa.”
(SIMMEN e KOHLHOFF, 2001, p. 93).
[8] Enquanto Malevich formulava
o Suprematismo, Tatlin iniciava o movimento construtivista com suas primeiras
construções, configurando o estilo russo de maior destaque seis anos depois. Ao
contrário de Malevich, Tatlin acreditava que a arte tinha um compromisso social
e político (DEMPSEY, 2003).
[9] FOSTER no artigo Archives of modern art publicado pela
October em 2002
[10]No dadaísmo, o protesto
foi levado às extremas conseqüências da negação absoluta da razão. Os dadaístas
propuseram, já que não se podia mais confiar na ordem estabelecida e na razão,
que a “criação” se libertasse de suas amarras do pensamento lógico e revelasse
apenas o automatismo psíquico selecionando e combinando elementos. Buscavam também acordar a imaginação, a
criatividade. A intenção no entanto foi de sátira e crítica e não estética, e
tinham como estratégia denunciar e escandalizar. A negação era contra tudo que
estivesse relacionado às tradições e aos costumes da sociedade, e a arte sendo
um produto desta sociedade a ser renegada em sua totalidade fazia parte destas
tradições e costumes. Não criavam obras mas fabricavam objetos. Por isso apesar
da muitas semelhanças na revolta e nas atitudes contestatórias dos
expressionistas, foram muito mais além. Subvertiam a autoridade e cultivavam o
absurdo. Dada era portanto anti-artístico, anti-literário, antipoético. Queria
romper com as leis da lógica, a imobilidade do pensamento, o universal em
geral. Valorizava a contradição, a anarquia e a imperfeição. Era também
antagônico ao modernismo que considerava como uma nova cristalização do
espírito, tendo se estabelecido num “status-quo”, sinônimo de imobilidade. Não
queriam nenhuma escravidão. Nem mesmo a de Dadá sobre Dadá. Defendiam esta
postura de incessante dinamismo da liberdade, de negação contínua de si mesmo,
como sendo a única maneira de garantir-se contra a estagnação. Não era mais a
obra que interessava e sim o gesto como provocação contra o bom senso, a moral
e os costumes. Era o desejo de transformar a poesia em ação, era um modo de
vida. O movimento estendeu-se para outros lugares da Europa tais como Paris,
Nova York, Berlim, Hanover, Colônia, Londres, San Francisco, Moscou, Budapeste,
Tokyo e Barcelona, assumindo um caráter internacional. Dadá foi a expressão da
vontade desesperada de afirmação do indivíduo como ser livre, num mundo
policiado onde as regras conduziram diretamente à catástrofe.
[11] Ele foi um dos artistas
pioneiros a aproximar-se da vida real em sua pintura, contribuindo para o
desenvolvimento do retrato psicológico.
[12] Smithson realizou um
projeto de recuperação da natureza através da arte com sua obra mais famosa, Quebra-mar em espiral de 1970, condenada
no futuro a desaparecer por ação desta mesma natureza.
[13] Uma nova função que o museu
pode abarcar seria a de guardar os equipamentos necessários ao acesso das
memórias acumuladas em diferentes mídias que com o desenvolvimento tecnológico
são rapidamente substituídas e descartadas.
[14] Titulo traduzido da publicação “ Le
peintre de la vie moderne” (BAUDELAIRE, ).
[15] Ainda que associando a criação ao ato de
representação
[16]“Le plaisir que nous retirons
de la repr’esentation du pr’esent tient non-seulement `a la beaute don til peut
etre revetu, mais aussi a sa qualite essencielle de present.”